23.6.08

Uma Casa na Escuridão (excerto)

" Na escuridão absoluta, a escuridão absoluta. Na escuridão, o silêncio. O frio. O medo de qualquer coisa desconhecida. E o tempo era o rio lento, negro, frio, que levava consigo o tempo de quem perdeu tudo. Eu sentia que morria devagar. A minha vida, a minha morte, era arrastada por esse rio de vozes que gritavam e escuridão em todos os lugares. Mas o tempo. O tempo. O tempo existiu até ao momento em que a casa se ergueu brilhante na noite do mês da noite. O cheiro a fumo. O som da madeira a crepitar sob as chamas. A casa ardia com chamas que a envolviam, como um farol na noite do mundo. Havia chamas que brilhavam no fundo do corredor. Através da porta aberta, eu via a sua luz reflectida nas paredes brancas. Os gatos, subitamente iluminados, continuavam a mudar de lugar com a mesma lentidão. Alguns continuavam a dormir um sono antigo. As chamas chegaram à porta do meu quarto e envolveram-na. Arderam durante instantes. Os meus olhos viam a porta arder, os tapetes a arder no chão, as vigas as arder no tecto. Os móveis do quarto ardiam. A janela, diante do meu rosto, ardia. Chamas pequenas subiam pelos pés da cama. Os meus olhos viam. (...)"

José Luis Peixoto

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